O catarinense de coração, Bruno Fontes já tem uma relação de 32 anos com a vela. Praticante do esporte desde 1987, Fontes afirma que foi o primeiro de sua família a construir uma relação com a modalidade. O caso de amor começou por eles serem frequentadores do Lagoa Iate Clube, em Florianópolis.

“Foi mais uma oportunidade que surgiu no clube. Ia sempre para jogar tênis, por exemplo. Meus pais frequentavam o clube, faziam churrasco lá e tinha escola de vela na Lagoa. Entrei pelo clube, mas a minha família não tinha tradição nenhuma no esporte”, afirmou o atleta.
Ao contrário do que muitas pessoas pensam, Bruno não nasceu em Santa Catarina. É natural de Curitiba, mas manezinho de coração. Com apenas dois anos, Fontes se mudou para Florianópolis, quando seu pai, engenheiro que trabalhava na Eletrosul, foi transferido para a cidade por causa do trabalho. O velejador afirma que tudo o que aprendeu e toda sua experiência de vida foram na Ilha da Magia.
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Nos Jogos Pan-Americanos de Lima, Fontes adicionou uma medalha inédita em seu currículo já recheado de conquistas. Com o segundo lugar na classe laser, o velejador faturou a prata, que perseguia desde os jogos de Guadalajara, em 2011. Após a conquista, ao invés de buscar uma medalha olímpica também, em Tóquio 2020, Fontes surpreendeu muitas pessoas e anunciou sua aposentadoria como atleta de vela.
Decisão pela aposentadoria 1p3a40
Quando ganhou a seletiva que garantiu a vaga nos jogos de Lima, ainda em novembro de 2018, Bruno Fontes já prestava uma consultoria para a equipe chinesa de vela há algum tempo. O atleta havia auxiliado a equipe na Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro, e também participado de alguns treinamentos em dezembro de 2018.
“Em dezembro eles me ofereceram um contrato até as Olimpíadas de Tóquio. Pedi para fazer consultorias pontuais e a gente podia ir construindo uma relação. Fiquei de dar uma resposta mais para frente sobre o projeto dos chineses”, relatou Fontes.

O atleta conta que sua família e o futuro dela também tiveram um peso na decisão pela aposentadoria. Independentemente de ganhar ou não a medalha pan-americana, a decisão de Fontes já estava tomada. Essa escolha era viver o projeto e caminhar a com China para os Jogos do Japão.
“O apoio ao esporte em geral caiu muito depois do ciclo olímpico e acabei pesando entre sonho pessoal, vaidade, ego e a nova carreira com um conforto para minha família. Foi uma decisão que levou sete meses para ser tomada. Desde dezembro até julho e foram vários fatores. Quando chegou o mundial no Japão, que a China me apoiou e patrocinou para correr como treinamento pelo Pan foi a gota d’água para perceber que não era ego. Infelizmente no Brasil não tinha condições razoáveis para representar o país e comecei a decidir”, afirmou.
Projeto chinês 2ph2w
Bruno afirma ter aberto mão do ciclo olímpico para fazer parte de um projeto que tem condições reais de conseguir uma medalha em Tóquio. Depois de algum tempo apenas prestando uma consultoria para a vela chinesa, ele agora será técnico em full time pela equipe da classe laser feminina.
“Nós estamos muito bem na corrida olímpica, ganhamos ouro na etapa do Mundial em Miami e prata em Gênova, na Itália. Vejo que temos chances reais de medalha em Tóquio, é um trabalho certo e a expectativa está muito boa, começamos muito bem e tem um respaldo legal dos líderes chineses também”.

Além do patrocínio chinês para participar de uma competição ainda pelo Brasil, Fontes afirmou que o reconhecimento e o comprometimento dos chineses também pesaram na decisão. Para o velejador, a troca pode ser benéfica para os dois lados e ele terá condições de contribuir com o respeito que construiu ao longo de anos no meio da vela. Poderá trazer atletas de outras equipes para treinar e trocar experiências, pois, para Fontes, o treino sozinho na vela é um treino enganador.
A modalidade no Brasil 6m1d1s
Para o velejador, o principal problema para o desenvolvimento e popularização da vela no Brasil é o próprio cenário político atual do Brasil. Fontes cita os cortes e contingenciamentos que o país sofre na educação como exemplo.
“Não tenho nada a falar de mal da confederação ou do COB (Comitê Olímpico Brasileiro). É a realidade brasileira, do país como um todo que reflete na falta de verbas e patrocínios. Como gestão do COB eu só tenho coisas positivas para falar depois da grande mudança que houve. O dinheiro não é pouco, mas é aquém do investimento que outros times têm para a compra de materiais e outras coisas. No Brasil é bem difícil para serviços básicos, imagina então para outras coisas como o esporte, que precisa de investimento constante”, desabafou.
O atleta ainda pensa que uma maior profissionalização do esporte poderia impulsionar um crescimento da vela. Muitas pessoas acabam abandonando os esportes de alto rendimento no Brasil – não apenas a vela – quando chega o momento de optar pela profissionalização ou estudar e trabalhar para ter uma garantia de sustento para a família. Isso ocorre principalmente nas modalidades em que não tem uma tradição tão forte como futebol.
“Para ser atleta tem que ser muito resiliente, aguentar a dor, trabalhar duro e muitas vezes não ter resultados. Quando tem o resultado, muitas vezes não é suficiente também. Tem que ter mais pessoas que queiram seguir o caminho do esporte, que é prazeroso, mas também muito difícil e de pouco reconhecimento, dessa forma poderíamos pensar em uma evolução do esporte no país”, finalizou o multicampeão e agora técnico chinês, Bruno Fontes.