Risadas, som alto, fumaça, móveis sendo arrastados e os gritos de “gol” são apenas alguns dos incômodos que moradores de casas e condomínios residenciais am todos os dias no Brasil. Caracterizados como perturbação do sossego diante da Lei, esses problemas podem ser inconvenientes e irritantes, ainda mais se forem frequentes.
“Toda noite, inclusive perto da meia-noite, era uma ‘arrastação’ de móveis e barulheira no apartamento de cima, muito barulho mesmo”. A reclamação é da moradora de um condomínio residencial no Centro de Itajaí, no Litoral Norte de Santa Catarina. Ela contou ao ND+ sobre incômodos frequentes com vizinhos e optou por não se identificar.

Além dos ruídos contínuos durante a noite, a fumaça de cigarro, risadas e comemorações durante partidas de futebol também incomodam a moradora. “A gente tentou conversar com eles pessoalmente, várias vezes. Sempre concordavam em resolver, mas o problema continuava”, ela destacou.
Dessa maneira, a saída da moradora foi recorrer às leis e, nesse caso, o regimento interno do condomínio. Para entender melhor essas ferramentas, o ND+ conversou com o professor formado em Direito e mestre em Ciência Jurídica pela Univali (Universidade do Vale do Itajaí), Luis Gustavo dos Santos.
O que é a perturbação do sossego e o que diz a Lei? 3m4x4p
Conforme Luis dos Santos, que também atua como advogado em Itajaí, a perturbação que tanto atrapalha o sossego das pessoas é “qualquer ação realizada por pessoas próximas de onde você mora que possam interferir no bem-estar ou na vivência do dia a dia”.
O professor destaca que é muito comum associar a perturbação do sossego com som e música alta, por exemplo. Já de acordo com o Artigo 42 do Decreto-Lei nº 3.688/1941, no Brasil é proibido atrapalhar o descanso ou trabalho de alguém:
- Com gritaria ou algazarra;
- Exercendo profissão incômoda ou ruidosa;
- Abusando de instrumentos sonoros;
- Provocando um animal de estimação.

Ainda segundo a Lei, as penas para o descumprimento da norma podem ser prisão simples, de 15 dias a três meses, ou multa. Contudo, além das regras federais que regulamentam esse tema, os municípios também podem criar as próprias leis do silêncio, como são conhecidas.
Em Itajaí, no Litoral Norte de Santa Catarina, a lei do silêncio vigente e que especifica os níveis de ruídos permitidos nas diversas áreas da cidade e horários é a Lei Complementar nº 24/2003. Para Luis Gustavo, “esse é um meio legal para fazer as pessoas se comportarem em sociedade sem que houvesse a necessidade de uma lei específica sobre perturbação”.
O documento ainda estabelece punições como notificação por escrito, multa simples ou diária, interdição parcial ou total de estabelecimentos e obras, cassação de alvarás de funcionamento, entre outras.
Conforme o advogado, as leis do silêncio também delimitam algumas zonas específicas no perímetro urbano onde são permitidos certos níveis de ruído sonoro. Por exemplo, de acordo com as leis vigentes em Itajaí, as áreas que estão a um raio de 200 metros de distância de hospitais, escolas, bibliotecas públicas e outros espaços do gênero são consideradas “Zonas de Silêncio”.

Como funcionam as normas dentro de condomínios e prédios? 726929
De acordo com o professor Luis Gustavo, não há uma legislação pública específica para a perturbação do sossego dentro de condomínios residenciais e, portanto, nestes espaços vale o regulamento interno do local.
Inclusive, essa foi a ferramenta utilizada pela moradora citada anteriormente nesta matéria. Ela detalhou que acionou o síndico do prédio e explicou a situação, o qual entrou em contato e cobrou os vizinhos sobre a perturbação constante.
“Como a algazarra continuou, o síndico fez uma notificação formal por escrito. A partir da notificação, caso os ruídos persistissem seria aplicada uma multa aos infratores”, explicou a moradora. Somente dessa maneira a situação foi resolvida.
Luis pontuou que as normas internas geralmente são estabelecidas em reuniões entres os moradores do condomínio. “Portanto, cada local poderá ter uma série de restrições detalhadas de acordo com os horários e desejos dos participantes”, comentou o professor.
Denúncias de perturbação do sossego 185x5o
O advogado disse ainda que nada impede o cidadão de recorrer à força policial, por exemplo, para lidar com a situação. Nesse caso, seria necessário entrar em contato com a Polícia Militar através do 190 e solicitar o atendimento, sendo necessário se identificar. Outra medida também citada é levar o caso para a Justiça.

Sobre a identificação ao fazer a denúncia, Luis reforçou que isso é algo intrínseco, ou seja, faz parte do processo. “Ao ligar para a polícia é exigida uma identificação, bem como ao ajuizar uma ação contra o vizinho ou vizinha”, esclarece.
O advogado aponta ainda que antes de fazer a denúncia é necessário levar em conta o bom senso. “No direito de vizinhança, é sempre importante lembrar que há a questão da tolerância e o bom senso para estabelecer se aquilo é razoável ou não, se foi só naquele dia ou é sempre, se talvez dê para revelar”, diz o professor.
Já em casos específicos como shows, festivais e outros eventos que podem gerar um certo incômodo para a vizinhança, é possível que os organizadores busquem um alvará de funcionamento na prefeitura. Esse alvará, por sua vez, vai permitir a realização do evento nas condições, datas e horários estipulados sem que haja o descumprimento de leis.
Ainda, Luis dos Santos relatou acreditar que nas regiões litorâneas, próximas a praias, há uma incidência maior desses casos, de forma que a cultura do local é mais propícia a isso. Contudo, quem escolhe morar nessas regiões deve saber dos eventuais riscos e que está sujeito a isso.
“Claro que não ao excesso, ninguém está sujeito ao excesso. Mas algo dentro da normalidade e que eventualmente o atrapalhe, você vai ter que tolerar”, finaliza o professor.
