A construção do loteamento Brisas da Ilha, com o desmate de 3,4 hectares de área com mata nativa a cerca de 1 quilômetro do Parque Natural Municipal Maciço da Costeira, mostra o atraso de Florianópolis na definição dos planos de manejo das UCs (Unidades de Conservação) da Capital.
Mais de dois anos após o parque ser categorizado como UC, conforme as normas federais, ainda não foram definidos os corredores ecológicos e a sua zona de amortecimento, nome dado às áreas no entorno das unidades. Previstas no plano, elas são importantes para garantir a transição sustentável entre o meio preservado e o urbano.

O terreno desmatado pela loteadora D’Agostini, no fim da servidão Dorval Manoel Bento, no Córrego Grande, equivale a mais de três campos de futebol. Está em uma APL (Área de Proteção Limitada), onde é permitida a construção sob regras e mediante autorização da Floram (Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis).
Segundo a Floram, o empreendimento foi licenciado através de três processos, justificados no ganho ambiental com a retirada de espécies invasoras. O processo começou em 2016, dois anos antes do parque ser categorizado como Unidade de Conservação. A construção dos 58 lotes teve início em setembro de 2020, sendo intensificada no fim de abril.
Nas últimas semanas, moradores e entidades do bairro realizaram manifestações contra o loteamento. Eles sustentam que a vegetação nativa, de Mata Atlântica, estava em estado avançado de regeneração. Além disso, a comunidade aponta que o bairro enfrenta altas taxas de ocupação e está sem infraestrutura para comportar tanta gente.

Área de transição 6r2a1i
“As bordas das UCs devem fazer o amortecimento, preferencialmente garantindo a transição entre a área protegida e o ambiente urbano de forma branda. Dessa forma asseguramos a agem dos animais, a troca de sementes das plantas, o sombreamento e até mesmo redução de ruídos, itens necessários para a que as UCs não sejam afetadas pelo efeito de borda”, explica Talita Goes, doutoranda em geografia na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).
Sem que o perímetro dedicado ao amortecimento seja formalizado, a permissão para os empreendimentos parte apenas da Floram, desde que respeitado o plano diretor e a lei da Mata Atlântica. A legislação é mais frouxa: caso houvesse plano de manejo, estaria mais claro o perímetro e as normas da área, baseadas em estudos mais detalhado do Parque.
Além disso, a decisão garantiria a participação popular. Os planos de manejo preveem a definição dos Conselhos Consultivos, formados por representantes das comunidades do entorno e que amparam as decisões, explica o professor Orlando Ferretti, do departamento de Geografia da UFSC.

Atraso ambiental 4u691r
A criação dos planos de manejo e conselhos consultivos está prevista na lei do do Snuc (Sistema Nacional de Unidades de Conservação). Apesar da legislação ser de 2000, somente a partir de 2015 as UCs de Florianópolis começaram a ser readequadas conforme a lei.
O atraso e a necessidade de readequação foi motivada por nomenclatura. “A maioria dos nossos ‘Parques Municipais‘ foram criados antes da lei. O que ocorre é eles precisariam se chamar ‘Parque Naturais Municipais’. Houve um grande atraso e descaso”, segundo Goes.
No caso do Parque Municipal do Maciço da Costeira, a categorização só ocorreu em 2018. A Floram tem até 2023 para regulamentar o plano, cumprindo o prazo máximo de cinco anos após a adequação, conforme previsto pelo Snuc. Não há data definida para a publicação do plano, mas ocorrerá nos próximos dois anos, garante a Floram.
Plano diretor das UCs 365t6x
“O documento é como um plano diretor de cada UC. É complexo e demanda tempo”, considera Beatriz Kowalski, superintendente da Floram.
Até o momento, das nove UCs, apenas o Parque Municipal do Morro da Cruz conta com plano de manejo definido. Dois novos planos estão previstos para serem publicados este ano.
Kowalski ressalta que as análises ambientais, feitas caso a caso, são rigorosas. “Trabalhamos com bastante rigor ético. Uma ocupação planejada previne a ocupação clandestina, e protege a área”. A superintendente cita o projeto de compensação ambiental, que prevê remoção de espécies exóticas e plantio de árvores nativas no terreno excedente.
A D’Agostini informa que “todas as exigências de licenciamento ambiental para construção do loteamento Brisas da Ilha foram completamente atendidas” e que a área da obra não faz parte da Zona de Amortecimento do parque.
Até o último ano, a resolução nº 428 do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) previa normas específicas para os empreendimentos próximos às Unidades de Conservação sem Zonas de Amortecimento, mas não se aplicava às Áreas Urbanas Consolidadas – categoria em que se enquadra as UCs de Florianópolis.