Um ano após a fraudulenta compra de 200 respiradores pulmonares no valor de R$ 33 milhões pelo governo do Estado, a força-tarefa formada pelo Ministério Público Estadual, Polícia Civil e Tribunal de Contas do Estado ainda busca identificar o paradeiro do dinheiro que saiu dos cofres públicos.

Depoimentos dos acusados, rastreio de contas bancárias e outras medidas têm sido adotadas pelos órgãos investigadores para tentar responder à pergunta que todos fazem: onde foi parar o dinheiro? A questão, parte do processo de impeachment do governador afastado Carlos Moisés (PSL) que terá desfecho na sexta-feira (7), é também tema da primeira série de reportagens que o Grupo ND inicia neste fim de semana.
Das duas ordens bancárias expedidas no dia 1º de abril de 2020 no valor de R$ 16,5 milhões cada uma, com os valores disponíveis na conta da empresa Veigamed Material Médico Hospitalar dois dias após, o que se sucedeu foi que rapidamente dissiparam-se os R$ 33 milhões das contas, inclusive com pagamentos de supostas comissões pelo negócio realizado, mesmo sem o fornecimento dos respiradores.
Há cerca de um ano, entre depoimentos, busca e apreensões de documentos, a força-tarefa traça um o a o do caminho dessa engenhosa pulverização da maior parte do dinheiro.
Segundo relatório feito pela Deic (Diretoria Estadual de Investigações Criminais) da Polícia Civil, o montante foi diluído em 56 transferências para contas diversas entre os dias 6 a 29 de abril do ano ado, boa parte para empresas ligadas ao setor de comunicação, eventos e marketing.
Importação custou R$ 12 milhões 225b68
A força-tarefa identificou que a Veigamed pagou R$ 12 milhões para a empresa TS Eletronic importar os respiradores. A compra foi por 150 aparelhos, e não 200 como descrito na dispensa de licitação. O pagamento foi dividido em dois depósitos, de R$ 8,06 milhões e de R$ 4,07 milhões, respectivamente nos dias 16 e 22 de abril – após o prazo de entrega previsto para a primeira remessa dos equipamentos.

De acordo com as autoridades que investigam o desvio, foi verificada também a transferência de R$ 2 milhões para a conta da empresa Remocenter Remoções e Serviços Médicos Ltda. Conforme levantamento do MPSC, esse foi o meio supostamente ilícito utilizado pelo médico e empresário paulista Fábio Ambrósio Guasti para o recebimento da comissão. Ele é apontado como o responsável por atuar em nome da Veigamed nas tratativas de contratação para a compra dos respiradores.
Análise dos documentos apreendidos pela força-tarefa apontaram que Fábio Deambrósio Guasti e a esposa, Paula Stela Martini Bartholomei Guasti, possuem um conglomerado de empresas denominado grupo Remocenter, que inclui a MeuVale, MeuHelp, RedeVale, Remocenter Ambulâncias e MaisOdonto. Essas empresas estão enraizadas em Santa Catarina, com contratos em prefeituras.
“Demonstrou-se também através dos apontamentos apreendidos em sua residência que Fábio Guasti foi o articulador junto ao Estado de Santa Catarina na negociação, atuando diretamente na precificação e nos modelos dos aparelhos que seriam entregues para ser utilizado no combate ao Covid-19”.
Rees em investigação 6i5n2q
Segundo a documentação apreendida pelos promotores e policiais, ainda houve um ree de R$ 30 mil para o investigado Leandro de Barros. Ele e Guasti são apontados nas investigações como fornecedores da Secretaria de Estado da Saúde, especialmente de respiradores pulmonares. Teria sido Barros que foi designado para tranquilizar a superintendente da secretaria de Estado da Saúde, Márcia Pauli, que no dia 02 de abril recebeu um alerta de que a Veigamed não adquiriu equipamento algum na China.
Por meio de quebra bancária da Veigamed, autorizada pela Justiça, a força-tarefa ainda encontrou duas transferências eletrônicas nos dias 03 e 06 de abril de 2020 para a empresa UL Química e Cientifica, um total de R$ 4,2 milhões. No dia 07 de abril, a UL Química vendeu a MMJS Desenvolvimento, no valor de R$ 3,1 milhões, máscaras e ventiladores pulmonares. No mesmo mês, dia 22, a Veigamed teria transferido R$ 320 mil para a MMJS, o que segundo a força-tarefa, essa movimentação bancária mostra uma ligação entre as empresas.
R$ 13,9 milhões estão bloqueados na Justiça 4f76e
Até o momento, o processo Nº 5040138-11.2020.8.24.0023 aponta que obtiveram êxito, por meio de bloqueio judicial, de pouco mais de um terço do valor desviado, cerca de R$ 13,9 milhões. Vale lembrar que esse dinheiro ainda não foi devolvido aos cofres públicos, já que as empresas envolvidas recorreram, judicialmente, do bloqueio dos valores.

Segundo as investigações, da quantia de R$ 13,9 milhões até agora identificada e bloqueada pela Justiça, R$ 11,1 milhões foram recuperados da Oltramed, empresa de equipamentos médicos em ville que recebeu esse valor da Veigamed pela compra de 100 mil kits para teste rápido da Covid. Foram seis transferências em valores diferentes pagas entre 8 e 29 de abril. Para a força-tarefa, a compra dos kits é uma hipótese de a Veigamed pulverizar os recursos “como manobras típicas de lavagem de dinheiro”.
Mais aproximadamente R$ 2,4 milhões foram transferidos pela empresa TS Eletronic, contratada pela Veigamed para a importação dos 200 aparelhos. Há ainda outros R$ 483,2 mil bloqueados das contas da empresa Veigamed, resultado de uma ação popular do deputado estadual Bruno Souza (Novo). A Justiça encontrou apenas esse valor na conta da empresa.
Outro ponto que ainda está sendo apurado pela força-tarefa é o destino de outros R$ 19 milhões. Há a possibilidade, que ainda é alvo de investigações, no qual R$ 12 milhões desse montante foi mesmo pago à fornecedora dos respiradores na China – o que corresponderia à aquisição de 150 aparelhos. A força-tarefa ainda trilha os caminhos para descobrir o destino e recuperar os valores pendentes.
Leandro de Barros nega ligação com compra fraudulenta 1k5l5c
O advogado Leandro de Barros negou ter recebido R$ 30 mil supostamente a título de comissão da empresa Veigamed, oriunda de sua suposta participação no processo de compra dos respiradores.
Segundo ele, houve um registro de e-mail unilateral, produzido e enviado internamente na referida empresa do grupo Meu Vale, sequer ele sido o destinatário do e-mail, assim como sequer recebeu o valor ali exposto.
“Ou seja, o que há é apenas um e-mail unilateral, sem qualquer contribuição do advogado Leandro Barros, que nunca recebeu estes valores, como já reafirmou e comprovou em inúmeras oportunidades”.
Barros disse que já foi esclarecido e comprovado que referido pagamento jamais ocorreu e não possui nenhum envolvimento espúrio na compra dos respiradores; segundo porque o extrato bancário da referida conta corrente cabalmente demonstra que os R$ 30 mil nunca foram recebidos pelo advogado.
“Importante destacar que o Ministério Público, sempre trabalhando em prol da justiça e da sociedade, efetuou integralmente o rastreio da verba paga pelo Estado à Veigamed na compra dos respiradores, todavia, não encontrou a transferência de nenhum valor às contas de Leandro Barros, justamente porque não existiu”, declarou em nota.
O processo tramita em segredo de justiça, mas, com todas estas novas provas amealhadas durante a investigação, ele aguarda o desfecho das investigações seguro de sua inocência e confiando no trabalho do Ministério Público, que “reconhecerá quem foram os verdadeiros responsáveis por este triste episódio advindo da compra dos respiradores”, finalizou.
Errata: a foto do modelo do respirador comprado pelo governo do Estado na China foi alterada