Destino de muitos turistas e de cada vez mais moradores fixos em Florianópolis, a região Norte da Ilha de Santa Catarina tem pendências a serem resolvidas antes do aumento populacional previsto para os próximos anos.
De acordo com projeções da prefeitura em meio à revisão do Plano Diretor, a população da Capital deve seguir um caminho de crescimento de 100 mil pessoas a cada década.

No Norte, o aumento no número de habitantes dos bairros vem ocorrendo há algum tempo. A soma da população dos seis distritos da região em 2000 era de 55.101 moradores. Em 2022, esse número pula para 112.285 pessoas.
Ou seja, em duas décadas a quantidade de pessoas vivendo no Norte da Ilha mais do que dobrou: 103,78%.
Moradores e líderes comunitários dos bairros da região destacam que esse crescimento ocorreu deforma pouco ordenada, resultando em diversos problemas estruturais, como instabilidade na rede de energia elétrica e falta de abastecimento de água, além de baixa cobertura de rede de esgoto e, é claro, muitos transtornos de mobilidade.

Com as previsões indicam ainda mais pessoas se instalando nos bairros da região nos próximos anos, além da expressiva procura pelos turistas, o desafio está em resolver as questões que já existem e estabelecer um adensamento populacional de forma consciente – que não signifique mais problemas estruturais e ambientais.
“Não existe uma densidade ideal para as cidades. Funciona como um sistema: é preciso olhar ao mesmo tempo a infraestrutura, o tecido urbano, as questões ambientais e também a paisagem”, destaca o doutor em arquitetura e urbanismo pela Politécnica da Catalunha (Espanha), Gustavo Andrade.
Ideia de verticalização é contraponto à atual expansão “para os lados” 6x5y3g
Uma das principais propostas da revisão do Plano Diretor é a verticalização/adensamento populacional em Florianópolis.
A minuta da prefeitura parte do princípio de que a cidade não a mais o modelo atual de crescimento “para os lados”, pois eleva custos e causa danos ambientais.
“Se não corrigir vai ser trágico para nossos filhos e netos”, alerta o secretário municipal de Mobilidade e Planejamento Urbano, Michel Mittmann.

O bairro dos Ingleses, o maior do Norte da Ilha de SC, é um exemplo utilizado pela prefeitura para ilustrar o desequilíbrio e os altos custos da baixa densidade: a estatística oficial aponta para 44,8 habitantes por hectare.
O município compara o índice com setores de cidades como Barcelona (Espanha), Nova York (EUA) e Buenos Aires (Argentina), em que esse número varia entre 320 a 360 habitantes por hectare.
Território x população:
- Área da cidade: 675,4 km2
- 500.973 habitantes é a população da cidade, segundo o censo IBGE 2019
- Densidade urbana de Florianópolis: 49,85
No Brasil, o setor estrutural de Curitiba apresenta um índice ainda maior: 600 habitantes por hectare. O arquiteto Gustavo Andrade concorda que existem benefícios em adensar a população, estratégia que tende a reduzir custos de serviços urbanos e favorecer o transporte coletivo, por exemplo.
Compare com outras cidades:
Ao defender o adensamento, o Ipuf cita o exemplo de outras cidades que têm regiões com índices bem altos de concentração urbana. De acordo com o órgão municipal, os cases não devem ser copiados, e sim servir de inspiração. Confira abaixo.
- Barcelona (Eixample): 360 hab/ha
- Manhattan (East Village): 320 hab/ha
- Buenos aires (Recoleta): 350 hab/ha
- Curitiba (Setor Estrutural): 600 hab/ha
Andrade ressalta, no entanto, que a Capital catarinense possui particularidades que merecem atenção: “Não é o mesmo falar de densidade em Florianópolis do que em Barcelona ou Nova York, que possuem metrô, vias largas e quarteirões regulares”.
Segundo o profissional, ter alta densidade sem infraestrutura é “um grande problema”, pois os transtornos podem se agravar e provocar um caso de congestão urbana.
“A infraestrutura e as conexões viárias devem sempre vir antes de qualquer adensamento, este é o papel do planejamento. É muito mais caro e difícil ter que desapropriar e demolir um tecido urbano já adensado”, destaca Gustavo Andrade.
Para a professora de Arquitetura e Urbanismo da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Margareth de Castro Pimenta, “o discurso das cidades europeias não corresponde minimamente com o plano”.
“As cidades europeias foram desenhadas historicamente e, a partir daí, os gabaritos foram rigidamente respeitados. O Plano Diretor proposto aqui vai criar, ao contrário da Europa, gabaritos díspares pelos incentivos de crescimento em altura, sem regulamentação clara, sem estabelecimento claro de limites construtivos”.
Ela reforça que a ideia de policentrismo não é criada “somente por decisão”, já que necessitam de estímulos e investimentos em serviços e comércios.
“Na Europa, os governos investiram, criando estabelecimentos escolares e de saúde, conectados a sistemas de metrô”, reforça.
Modelos de outras cidades devem servir de inspiração h6l4
“Temos que buscar um equilíbrio”, argumenta secretário de Mobilidade e Planejamento Urbano. Em defesa dos exemplos indicados pelo município, Michel Mittmann afirma que os exemplos de cidades não são modelos a serem “copiados” por Florianópolis.
“Só demonstram de forma inequívoca que é necessário reequilibrar as densidades em alguns pontos do território para que consigamos efetivamente buscar a implantação das infraestruturas necessárias com o adequado investimento por cidadão e que consigamos atender às demandas”, pontua.
De acordo com Mittmann, o município aposta em incentivar a criação das infraestruturas com critérios e aliado com centralidades e necessidades adequadas a cada região.
O secretário defende que as alterações no Plano Diretor são fundamentais para a cidade, com base em estudos do ICES (Iniciativa Cidades Emergentes e Sustentáveis).
“Atualmente, temos locais com densidade menor de 20 hab/ha (habitantes por hectare). Os estudos indicam um cenário tendencial alarmante e que devemos buscar ao menos 69 hab/ha ou até 74 hab/ha para a região metropolitana”, afirma.
Mittmann destaca a necessidade de uma mudança no Plano Diretor nessa questão. “É de difícil defesa um modelo de cidade se espalhando pelo território, sem infraestrutura, sem usos adequados, sem conectividade, que aumenta o preço da terra e expulsa moradores de baixa renda e avançando sobre áreas ambientalmente sensíveis”.
Ele reforça que o Plano Diretor atual não é adequado do ponto de vista de sustentabilidade econômica, social e ambiental.
Ao aprofundar as ações de investimento e incentivos para um ordenamento estrutural, a proposta prioriza a busca por equilíbrio: “O que a gente deseja é um adensamento equilibrado de acordo com o tipo do bairro, e isso naturalmente traduz-se também em infraestruturas”.
“A partir do momento que a gente permite uma regularidade, gera controle de outorgas, que os incentivos para permitir o eventual adensamento sejam também vinculados à implementação de infraestrutura, se cria um ciclo virtuoso de correção da situação”, explica Mittmann.