Desde que a imprensa divulgou nesta segunda (20) a possibilidade de um calote de R$ 1,6 trilhão (US$ 300 bilhões) da segunda maior incorporadora da China, a Evergrande, a economia de todo o mundo está em suspense.
A expectativa é porque se a empresa não pagar a dívida, o calote pode provocar um verdadeiro ‘strike’ no mundo financeiro e ainda afetar diretamente as exportações brasileiras.

Em entrevista ao portal R7, o analista da Terra Investimentos, Regis Chinchila, afirmou que o efeito da crise seria causado por uma possível desaceleração da economia chinesa. Nesse caso, seria “bastante ruim” para o Brasil, principalmente para o setor de matérias-primas, já que a China é a principal parceira comercial do Brasil .
Para Chinchila, pode haver ainda um “efeito cascata” no mercado global com a confirmação do calote: “o mercado comercial, principalmente o de commodities [matérias-primas], como minério de ferro, siderurgia e proteína animal, tem um risco que está sendo monitorado”.
Segundo dados do Ministério da Economia, somente neste ano a China comprou 63% das vendas externas brasileiras de minério de ferro, 69% da soja em grão e 49% do petróleo. Além disso, também teve grande participação nas compras de carne bovina (57%) e celulose (42%).
O professor de contabilidade financeira e tributária da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Murillo Torelli, lembra que um terço do PIB chinês tem origem na construção civil. “Se quebrar uma grande construtora na China, a demanda por minério de ferro e outra commodities tende a cair bastante”, afirma.
Mercado interno 1l4iv
Embora não confirmada, a eventual quebra da incorporadora poderia ter um efeito positivo para as famílias brasileiras: a maior oferta de produtos no território nacional e, consequentemente, uma queda nos preços desses itens que são enviados em sua maioria para a China.
Para o professor Torelli, a economia tende a ficar menos aquecida com a restrição das exportações e pode existir uma deflação de preços. No entanto, ele não vê sinalização de altas mais contidas na taxa básica de juros para segurar os preços no mercado nacional.
Hoje, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) acumula uma alta de 9,68% nos 12 meses encerrados em agosto, acima de 4 pontos percentuais em relação ao teto da meta estabelecida pelo governo para o índice deste ano, de 5,25%.
Por outro lado, se a quebra da empresa ocorrer, o professor avalia que a menor injeção de dinheiro em território nacional tende a derrubar a Bolsa de Valores e a concessão de crédito no Brasil. “O investidor estrangeiro vai tirar o dinheiro daqui com medo do risco e também não empresta dinheiro. Sem crédito, as empresas não crescem e nem se desenvolvem”, diz.
Dificuldades financeiras 4m6p
A incorporadora começou a mostrar sinais de dificuldades financeiras em agosto de 2020, o que aumentou após o anúncio aos credores de que ela não pagaria os juros das dívidas que venciam nesta semana. Foi suficiente para causar um colapso dos mercados mundiais.
Com o temor de um eventual calote, o Ibovespa, principal índice acionário do Brasil, recuou 2,33% nesta segunda (20), atingindo o pior nível em quase 10 meses. O dólar saltou 0,78% e fechou o dia cotado a R$ 5,329.
As principais perdas do dia estão relacionadas às empresas de matérias-primas, como Vale (-3,3%) e Petrobras (-1,12%), produtoras dos itens mais exportados pelo Brasil.
Na manhã desta terça (21), o mercado nacional mostrava alguma recuperação, mas sem reverter as perdas da véspera. Às 11h40, enquanto o Ibovespa avançava 0,38%, chegando a 109.258 pontos, o dólar caiu 0,17% e ficava cotado a R$ 5,322.
Reflexos nas incorporadoras brasileiras 5t4g1f
Felizmente, para empresas do mesmo ramo da Evergrande, a legislação nacional inibe que possíveis falências resultem em prejuízo aos compradores de imóveis na planta, devido a uma regulação mais efetiva.
O professor explica que pode haver medo de investir com a notícia de que uma grande incorporadora está quebrando, mas que o Brasil tem uma segurança jurídica que é o patrimônio de afetação, criado após a quebra da Encol nos anos 1990.
Torelli afirma que a medida faz com que todos os recursos alocados para a construção de um empreendimento fiquem direcionados apenas para a obra, sem entrar no patrimônio das empresas.
“Caso ocorra falência, os proprietários que compraram os apartamentos na planta continuam a obra com o dinheiro que já investiram. É uma situação que tenta proteger os brasileiros de uma quebra como a da Evergrande, que pode deixar milhares de chineses sem receber seus apartamentos e nunca vão receber nada”, completa o professor.