Para celebrar o centenário de Waldir Brazil, livro contará a vida do ilhéu 4zv60

Ator, diretor de teatro, cantor, compositor e radialista é um dos mais longevos protagonistas da cena cultural de Florianópolis

Muitos florianopolitanos já se notabilizaram nos palcos, no rádio, na música e na boemia, mas poucos foram bons em tudo isso e deixaram marcas em distintos ambientes e cenários da vida da cidade. Um dos donos desses múltiplos talentos foi Waldir Brazil, ilhéu cujo centenário de nascimento a família e amigos comemoraram no dia 18 de fevereiro.

Neno Brazil, filho, confidente e parceiro de Waldir, escreve obra sobre a história do pai – Foto: Anderson Coelho/NDNeno Brazil, filho, confidente e parceiro de Waldir, escreve obra sobre a história do pai – Foto: Anderson Coelho/ND

O ator, diretor de teatro, cantor, compositor e radialista foi um dos mais longevos protagonistas da cena cultural da capital catarinense. Houve e haverá homenagens a ele, mas um livro em fase em finalização irá contar a história dessa figura ímpar, pela pena de Neno Brazil, filho de Waldir, que também atua na área artística e foi parceiro e confidente do pai durante boa parte de sua carreira.

Waldir Brazil conheceu uma cidade bem diferente da atual, com suas casas baixas, o contato do centro histórico com o mar e a calmaria provinciana da primeira metade do século ado.

Nascido em Coqueiros, em 1920, ele perdeu os pais muito cedo e foi criado por uma tia-avó materna no largo 13 de Maio, próximo à Prainha, onde surgiu o primeiro aterro de Floripa.

Depois de empinar pipas com os amigos nesse lugar ermo, teve contato com os boêmios da redondeza, uma velha guarda que cantava, contava causos e declamava poesias – numa roda de chimarrão!

O primeiro trabalho que arranjou, sem qualquer remuneração, foi o de levar latas de filmes do cine Ideal para o Odeon, ambos na região central, ganhando o direito de assistir às sessões de graça.

Era o começo de uma comunhão com a arte de representar que lhe permitiu contracenar com Eva Todor e Antônio Fagundes, entre outros, na futura trajetória de ator.

Foi por conta da sétima arte que Brazil ou a imitar Humphey Bogart e fazer, com um cigarro entre os dedos, charme com as garotas quando chegou à adolescência!

Àquela altura, já existia o teatro da União Recreativa Beneficente Operária, a Ubro, inaugurado em 1922 para encenar dramas portugueses e atos variados cuja receita ajudava a amparar trabalhadores afastados por algum problema de saúde ou acidente, num tempo em que ainda não havia os benefícios da Previdência Social.

O teatro da Ubro foi onde o imitador de galãs de Hollywood fez os primeiros papéis no palco e conheceu a atriz Yvonne Rodrigues Catão, então com 17 anos, que viria a ser sua companheira pela vida toda.

Na peça “A filha do sapateiro”, Yvonne fazia a mocinha e Waldir Brazil o “cínico”, epíteto usado na época para denominar o vilão da história. O casal teve cinco filhos, todos com algum tipo de pendor artístico.

Grandes parceiros no palco e na tela 251l6a

Após fazer o serviço militar na Base Aérea de Florianópolis, de onde saiu com a patente de cabo, Waldir Brazil entrou com tudo na carreira de ator, que lhe permitiu dividir o palco com Virgínia Lane (uma das maiores vedetes do teatro e da música no Brasil), Zbigniew Ziembinski (grande ator e diretor de teatro e cinema), Eva Todor, André Villon e, nas telas, com Antônio Fagundes, Ítala Nandi, Leona Cavalli e Luís Melo.

Ele também criou o personagem Zecatau, que percorreu o Estado em temporadas cômicas, praticamente lançou no meio radiofônico o cantor e compositor Cláudio Alvim Barbosa, o Zininho, e acompanhou o surgimento de Neide Mariarrosa, cantora local que chegou a ser comparada à “divina” Elizeth Cardoso.

Foi de Brazil a ideia de apelidar de Pituca o ator Mozart Régis, que depois, no Rio de Janeiro, seria diretor de programas de televisão como “Viva o gordo” e “Balança mas não cai”.

Em peças adultas e infantis, contracenou com nomes importantes do teatro ilhéu como Deodósio e Teodorico Ortiga, Demerval Rosa, João Fontoura e Clementino Brito.

Também foi um cantor afinado e criou com amigos os Demônios do Ritmo, um “regional” (denominação dada aos grupos musicais) que animou durante anos a noite da Ilha de Santa Catarina. Nele, Brazil desenvolveu suas aptidões de crooner, pandeirista e compositor.

“Meu pai nunca foi um profissional da arte e ganhou a vida como funcionário da Caixa Econômica Federal, onde trabalhou durante 35 anos”, afirma o filho Neno Brazil.

O rádio, onde tudo acontecia m4n46

O rádio, onde tudo acontecia Um dos episódios que marcaram a presença de Waldir Brazil foi ter transformado o amigo Ocir Campos num dos primeiros Reis Momo da cidade, com peruca e falsa coroa de ouro.

Com produção esmerada, Momo aportava no Trapiche Municipal (o bar Miramar) e debaixo de fogos de artifício e charanga recebia a chave da cidade das mãos do prefeito, abrindo o Carnaval na Ilha.

Depois, a comitiva do rei ia de baile em baile nos clubes das partes insular e continental da Capital, dando seu aval para a abertura da folia em cada bairro ou comunidade.

Grupo Demônios do ritmo (1938) – Foto: Divulgação/NDGrupo Demônios do ritmo (1938) – Foto: Divulgação/ND

Na época, faziam muito sucesso as radionovelas, com artistas exclusivos de cada emissora, e os programas de auditório ao vivo, que exigiam capacidade de improvisação e timing para os esquetes cômicos.

Foi com o cast da rádio Diário da Manhã que o ator excursionou pelo Estado, integrando a “Caravana da Alegria” com um show de variedades, muita música, esquetes humorísticos e o Zecatau contando piadas.

Já nos anos 70, na rádio Santa Catarina, ele comandou o programa “Manhã sertaneja”, que tinha o diferencial de distribuir prêmios inusitados (como galinhas vivas) aos fãs.

O rádio reunia feras do microfone como Dakir Polidoro (primo de Waldir Brazil, famoso pelo programa “Hora do Despertador”), Zininho (com o programa “Bar da Noite”), Nabor Ferreira, Osmar Silva, Gustavo Neves, Adolfo Zigueli, Ilmar Carvalho, Jayro Silva, Alda Jacinto, Neide Mariarrosa e Antunes Severo.

Carteira de Waldir Brazil na rádio Diário da Manhã – Foto: Divulgação/NDCarteira de Waldir Brazil na rádio Diário da Manhã – Foto: Divulgação/ND

Compositor, Brazil escreveu a marcha “Sereia do Bom Abrigo”, que foi cantado durante anos no Carnaval da Ilha. E continuou no rádio, com programas que abriam espaço para intérpretes de talento na cidade, como Yvonésio Catão, seu cunhado e parceiro de serestas.

Cinema 12o12

Em 1957, o ator fez parte do elenco de “O preço da ilusão”, o primeiro longa metragem catarinense, produzido pelo Grupo Sul. Mais tarde, ele atuaria em outros filmes, como “Prata palomares”, de André Faria, com Renato Borghi e Ítala Nandi no elenco, o curta “Manhã”, de Zeca Pires, “PSW – Uma crônica subversiva”, sobre a trajetória política e o desaparecimento do deputado Paulo Stuart Wright durante a ditadura militar, além de “Desterro”, de Eduardo Paredes, “Modernos do Sul”, de Kátia Klock, “Perto do mar” e “Ponte Hercílio Luz”, outros projetos de Zeca Pires.

Uma carreira inteira na mesma cidade 52252r

Neno Brazil é o filho caçula de Waldir e ficou responsável pela guarda do espólio do pai e pela reunião de material sobre sua vida e obra. Além da peça “Memória”, preparou um documentário de 15 minutos que foi exibida da antiga RBS, dentro de uma série sobre personagens da cultura catarinense.

Waldir Brazil no filme “Perto do Mar”. Artista manezinho da música, teatro e cinemaWaldir Brazil no filme “Perto do Mar”. Artista manezinho da música, teatro e cinema

Neno tem outras paixões, como as viagens de jipe pela América do Sul e o prazer de fotografar e catalogar imagens de pássaros, a ponto de ter editado um guia de aves em 2009. “Todo ilhéu é um pouco arinheiro”, explica ao dizer por que cultiva esse hobby.

O filho de Waldir também é cenógrafo premiado e participou de filmes como “O demônios e as margaridas” e “O santo mágico”, este baseado em obra homônima de Harry Laus, ambos de Ronaldo dos Anjos.

As irmãs de Neno se envolveram com o teatro e uma delas, Maria da Graça, chegou a fazer um papel secundário na peça “Toda donzela tem um pai que é uma fera”, no TAC (Teatro Álvaro de Carvalho).

Neno conta que o pai teve vários convites para ir trabalhar no Rio de Janeiro, convidado por Virgínia Lane, Ziembinski e outros atores e diretores, mas preferiu investir na carreira de bancário e fazer teatro na província.

“Tinha a mãe doente e já era casado e com filhos”, diz Neno, ao explicar a decisão de Waldir. No final da vida (ele morreu em 2006), ainda teve músicas de sua autoria gravadas por Denise de Castro e Fernando Bahia.

Atuação no teatro 2mg28

No teatro, Waldir Brazil atuou em um grande número de montagens, especialmente do grupo Armação, como “Caminho de volta”, “Clitemnestra vive”, “Eles não usam black-tie”, “Os órfãos de Jânio” e “Tchekov em dois tempos” – esta ficou três anos em cartaz, viajou e participou de festivais fora do Estado.

Filme “Ilha”. Na foto, Brazil com Zeca Pires e Leona Cavalli no ano 2001. Foto: Divulgação/NDFilme “Ilha”. Na foto, Brazil com Zeca Pires e Leona Cavalli no ano 2001. Foto: Divulgação/ND

Seu filho Neno escreveu e dirigiu “Memória – A espessura da poeira de palco”, no qual Brazil contracenou com o ator Ademir Rosa e, depois, com Édio Nunes. Também trabalhou com o grupo O Dromedário Loquaz nas peças “Que a, Che?” e “Curto circuito”.

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