Na música “Garotos”, o cantor Leoni escancara um senso comum que muitas vezes é cruel para as mulheres. Na letra o músico declara — entre outras coisas — que “Garotos, sempre tão espertos/ perto de uma mulher, são só garotos”.
A canção, vista por muitos como romântica, revela uma visão machista e dura praticada por muitas pessoas. Enquanto homens são vistos como “eternos garotos”, que demoram a ter consciência sobre seus atos, mulheres recebem na infância a responsabilidade — e em alguns casos a culpa — por todos os erros, inclusive pelos abusos sofridos por elas.

É claro que, independente do gênero, pessoas precisam ter consciência e responsabilidade sobre erros e acertos, entretanto, para as mulheres recai um peso muito maior da responsabilidade e culpa, seja por gestações indesejadas, relacionamentos tóxicos e até sobre abusos.
Neste último exemplo, os números exemplificam bem a realidade de meninas catarinenses. Dados do DataSUS apontam que, entre 2011 e 2020, mais de 4,4 mil meninas de até 14 anos deram à luz no Estado, entretanto, apenas 29 abortos legais foram realizados em pacientes da mesma faixa etária.
> Como os casos de gravidez por estupro afetam as mulheres de forma coletiva 193t
O código penal brasileiro é claro quanto a atos de conjunção carnal com pessoas menores de 14 anos, ao explicar que qualquer prática neste sentido ou ato libidinoso com menores é crime. Portanto, crianças e adolescentes dessa faixa etária só engravidam quando são vítimas de estupro de vulnerável.
São inúmeros os casos, de grande repercussão midiática ou não, de meninas menores de 14 anos que engravidam e são criticadas quando buscam o aborto legal — isso quando o direito não lhes é negado justamente por quem deveria assegurá-los.

A psicóloga Tamyres Berti atuou no Núcleo de Apoio Especializado da Vara da Infância e Juventude no Tribunal de Justiça de Maringá, no Paraná, e acompanhou inúmeros casos de meninas e mulheres que gostariam de fazer a entrega voluntária dos bebês.
“É importante que as mulheres saibam que a entrega voluntária é um direito, já que a legislação só permite o aborto em casos de estupro ou bebês anencefálicos. Por muito tempo as discussões no mês da mulher eram superficiais, então é realmente muito importante construir espaços onde meninas e mulheres possam trazer pautas importantes acerca de seus direitos”, destaca.

A profissional reitera que, mesmo nestes casos e até em condições que o aborto é legal, mulheres e meninas não conseguem o facilitado a estes direitos, justamente por levarem essa carga de culpa e julgamentos diante à sociedade.
Porque responsabilizamos as mulheres cada vez mais cedo? 36703c
“Nós temos um sistema patriarcal e machista enraizado na sociedade em que mulheres precisam estar sempre favoráveis a estes sistemas. Então desde crianças, meninos e meninas são criados de forma distintas e nestas diferenças, os papéis são destinados. As meninas são vistas como mais responsáveis, maduras, crescem mais rápido e isso é algo totalmente social”, destaca Tamyres.
Por serem vistas como mais responsáveis e maduras, mulheres recebem cada vez mais cedo deveres e – quando algo de errado acontece – é delas a culpa. A profissional reitera que essa visão de que mulheres são mais responsáveis e maduras é algo totalmente social e não tem ligação psicológica ou biológica.

Até mesmo a construção de que mulheres têm instinto materno desde criança, cai por terra. Tudo faz parte de uma construção social que reforça certos comportamentos em meninas e outros em meninos.
E é diante desta visão de “mais responsáveis e maduras”, que responsabilidades são colocadas sobre as meninas que se tornam mulheres sobrecarregadas. “Nós não procuramos por mais responsabilidade, isso nos é imposto de uma forma muito cruel”, reforça Tamyres.
Tanta responsabilização, resulta na cultura de estupro. “Neste ponto específico a gente precisa falar de gênero, por mais que alguns homens sofram desta violência também, a maioria das vítimas são mulheres e isso independe da idade, desde bebês mulheres são abusadas e violadas”, salienta.
Um tempo onde meninas e mulheres não tenham que ser tão fortes 3n305w
Parece que, coletivamente, é inaceitável ver meninas crescendo sem sobrecarregá-las com as responsabilidades inclusive sobre a própria segurança, enquanto homens são criados com olhar de que o corpo da mulher é praticamente público e nós — mulheres — é que devemos escondê-lo para não serem invadidos, violados ou simplesmente criticados.
Está sobre as mulheres a responsabilidade de evitar gestações, de chefiar famílias desestruturadas, de assumir filhos sozinhas — afinal, “elas já sabiam o que estavam fazendo, né"});// Remover os listeners após a execução document.removeEventListener('click', loadTaboolaConfig);document.removeEventListener('touchstart', loadTaboolaConfig);document.removeEventListener('mousemove', loadTaboolaConfig);document.removeEventListener('keydown', loadTaboolaConfig);}document.addEventListener('click', loadTaboolaConfig);document.addEventListener('touchstart', loadTaboolaConfig);document.addEventListener('mousemove', loadTaboolaConfig);document.addEventListener('keydown', loadTaboolaConfig);});