Neli Goes sempre foi uma mulher à frente do seu tempo. Ativista, formadora de opinião é o tipo de mulher que não a despercebida. Pedagoga, hoje aposentada pela Udesc (Universidade do Estado de Santa Catarina), ela é referência nas questões voltadas ao ativismo do movimento negro em Florianópolis desde a década de 1980.

Filha de manezinhos do Leste da Ilha, ela nasceu na Capital em 1942 e cresceu nas ruas do Estreito, no Continente. Foi lá que ela conheceu e se casou com Carlos Ribeiro dos Santos, que anos depois se tornou o primeiro delegado de polícia negro de Santa Catarina – a partir de quando ficou instituído que para exercer a função era necessário ter formação em direito.
“Desde sempre tivemos uma vida muito agitada, muito envolvida com a comunidade. Quando meu marido assumiu a função pública mudamos para várias cidades, Joaçaba, Criciúma. Por fim, antes de se aposentar, ele foi transferido para a Capital”, recorda Neli.
Foi nessa época que a então dona de casa resolveu voltar a estudar. “Aos 30 anos e com dois filhos decidi fazer pedagogia na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). Depois disso tive uma escola, fui convidada a atuar na Secretaria Municipal de Educação e ingressei como concursada no curso de Pedagogia da Udesc”, conta a entrevistada.
Em toda a carreira, no dia a dia da sociedade, as discussões acerca das questões da representatividade e luta por espaços e direitos da população negra sempre esteve em evidência na vida de Neli.
“Foi na academia que pude compreender melhor a importância de organizar um movimento, um coletivo, que se preocue, discutisse, defendesse e melhorasse a vida da população negra”, explica Neli.
Associação das Mulheres Negras Antonieta de Barros 3v6p1z
Foi na década de 1980 que Neli e cerca de uma dezena de mulheres negras se reuniram e criaram a Associação de Mulheres Negras Antonieta de Barros. “A gente se reunia para discutir as necessidades de nosso povo, cobrar mais representatividade do negro em órgãos estatais no mercado de trabalho e por aí vai”, conta.
Segundo ela, “era um tempo de muita segregação racial. Tínhamos os clubes clássicos da cidade, nos quais só frequentavam brancos – a exceção era um ou outro negro que tinha certa ascensão social mais elevada. Mesmo assim era um em meio a uma multidão de brancos. As pessoas falavam que lugar de negro era no Carnaval, nos morros, não nas outras áreas importantes da sociedade. Tentamos mostrar o contrário”.

Um dos eventos mais marcantes na trajetória da associação, conforme Neli, foi quando eles trouxeram à Capital a então deputada federal pelo PT Benedita da Silvas, criadora da Lei das Empregadas Domésticas.
“Era 1988, vivíamos o centenário da abolição da escravidão, o tema estava muito em alta e participamos de vários atos e discursos. A associação fez o convite para a deputada vir a cidade compartilhar experiências e ela aceitou. Foi muito produtivo, ela deu palestra na universidade, foi a comunidades, foi um momento bastante instrutivo. Mas tiveram muitos outros de discussões fervorosas lutas e vitórias”, enaltece Neli.
Por anos o grupo fez a diferença e trouxe questionamentos importantes à sociedade florianopolitana. “Não fiz nada a mais do que minha obrigação. Mas foi uma época de muito trabalho e conquistas”, finaliza Neli.
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Quer saber mais sobre a história e a origem do movimento negro no Brasil? Confira uma reportagem especial do Grupo ND clicando aqui. O papel do movimento negro na formação da Florianópolis multicultural de hoje também foi tema de outra reportagem do projeto Floripa 350.
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O projeto Floripa 350 é uma iniciativa do Grupo ND em comemoração ao aniversário de 350 anos de Florianópolis. Ao longo de dez meses, reportagens especiais sobre a cultura, o desenvolvimento e personalidades da cidade serão publicadas e exibidas no jornal ND, no portal ND+ e na NDTV RecordTV.
No mês de agosto, o projeto conta histórias de ‘Mulheres da Ilha’. Personagens com diferentes perfis que fazem a diferença na Ilha da Magia.